O Direito à Saúde, na condição de direito (e dever) fundamental social consagrado no artigo 6º da Constituição Federal e objeto de regulamentação na ordem social (Art. 196 e ss.) tem amplamente deduzido em Juízo e patrocinado acalorado debate doutrinário, inclusive levando à realização de audiência pública pelo STF, que, especialmente no julgamento da STA 175, março de 2010, Relator Ministro Gilmar Mendes, consolidou uma série de critérios respeitantes ao tema.
Nesse contexto, responda as questões a seguir formuladas:
1) Tratando-se de direito fundamental, o direito à saúde aplica-se o regime jurídico pleno das normas de direitos fundamentais? Justifique .
2) Qual o sentido da assim chamada dupla dimensão objetiva e subjetiva do Direito (e dever) à Saúde e quais as principais consequências decorrentes de tal condição?
3) A titularidade do direito à saúde é individual ou transindividual (coletiva ou difusa)? Justifique com base na orientação adotada também pelo STF?
4) Quanto em causa a sua função positiva, ou seja, de direito subjetivo a prestações materiais do poder público, quais são as principais objeções invocadas em sentido contrário ao reconhecimento de um direito subjetivo pela via judicial e quais são principais argumentos e critérios utilizados para superar, no todo ou em parte, tais objeções?
No que se refere ao item (i), é indubitável que os direitos sociais foram acolhidos pela Constituição Federal de 1988 como verdadeiros direitos fundamentais. Note-se que nossa Lei Maior não fez distinção entre os direitos e deveres individuais e coletivos e os direitos sociais, declarando, genericamente, que os direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata, nos moldes de seu artigo 5°, §1°. Entretanto, é certo também que nem todos os direitos sociais são exigíveis de plano, haja vista o problema da reserva do financeiramente possível (limitações econômicas do Estado), impondo-se a ponderação frente ao binômio “razoabilidade da pretensão” e “disponibilidade financeira do Estado”, tal como alertado pelo Min. Celso de Mello na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental de n° 45.
De seu turno, quanto ao item (ii), o direito fundamental à saúde sob o prisma da dimensão subjetiva espelha a dimensão clássica dos direitos fundamentais como um direito público subjetivo de seu titular de exigir de alguém uma determinada prestação (no caso, o tratamento de saúde que lhe couber à preservação, em último grau, de sua vida). Outrossim, a dimensão objetiva circunscreve-se à ideia de que, subjacente a um direito fundamental, há um valor que se irradia sobre o ordenamento jurídico (eficácia irradiante dos direitos fundamentais), gerando deveres de proteção. Nessa prima, o Poder Público deve velar, de maneira responsável, pelo cumprimento e implementação das políticas sociais e econômicas idôneas que assegurem aos cidadãos o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar.
Por sua vez, em relação ao item (iii), o artigo 196 da Constituição Federal, ao expressar que a saúde é “direito de todos”, veicula direito individual e também direito coletivo “lato sensu” à saúde. A respeito, diante da omissão do Texto constitucional de 1988, a alocação de recursos à saúde deve ser atribuída aos órgãos políticos, conquanto detentores de legitimidade democrática, ou seja, amparados pela representação popular. Logo, ordinariamente, os recursos econômicos à saúde não devem ser aferidos concreta ou individualmente, sob pena de mácula ao princípio da igualdade e consequente comprometimento do Sistema único de Saúde. Isso, contudo, não inviabiliza a atuação judicial excepcional, pois, a despeito de o direito à saúde consolidar-se em norma constitucional programática, a omissão injustificada do Estado em efetivar as políticas públicas essenciais para a promoção da saúde atenta contra o mínimo existencial, derivado que é do postulado central da Constituição de 1988 da dignidade da pessoa humana.
Derradeiramente, no que toca ao item (iv), as principais objeções à tutela judicial individual do direito fundamental em apreço residem: a) na opção política na Constituição de 1988 de macro justiça, isto é, nas escolhas alocativas atribuídas à Administração (valores e destinatário da disponibilização), uma vez que o Judiciário, como concretizador de microjustiça, não dimensionaria as consequências globais da destinação de recursos públicos em prol da parte, prejudicando o todo; b) na configuração da norma atinente ao direito social à saúde se revelar como programática, dependente de políticas públicas, afastando a intervenção do Judiciário, sob pena de ofensa ao princípio da separação dos Poderes e da reserva do financeiramente possível. Ao revés, como critérios primordiais para superação às críticas acima se destacam; a) a efetivação pelo Judiciário do direito à saúde estaria, compreendida pelo postulado da dignidade da pessoa humana, pelo mínimo existencial; derivando inclusive da força normativa da Constituição; b) o perigo da genérica adução de uma norma da Constituição qualificar-se como programática torna-la uma promessa constitucional inconsequente.
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