Questão
TJ/SP - 186º Concurso de Ingresso na Magistratura - 2015
Org.: TJ/SP - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disciplina: Direito Penal
Questão N°: 002

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Enunciado Nº 000753

Geraldina, 13 anos, namora há mais de 02 (dois) anos com Vitelino, 18 anos, com o conhecimento e consentimento de seus genitores. O pai da infante ficou sabendo que o casal mantém conjunção carnal há meses e, inconformado, levou a notitia criminis à Autoridade Policial, que instaurou procedimento investigatório. Na sequência, Vitelino foi denunciado como incurso nas penas do artigo 217-A, c.c. o artigo 71, ambos do Código Penal. A vítima, em juízo, esclareceu que consentiu com todas as relações sexuais, aproximadamente 42 (quarenta e duas) e que pretende se casar, em breve, com o réu e, inclusive, ter filhos. O genitor de Geraldina admitiu conhecer o acusado e sua família há anos, tendo consentido com o namoro, mas exigiu respeito a sua filha. Em seu interrogatório, Vitelino destacou seu amor pela ofendida e admitiu as relações sexuais por ela consentidas há meses, antes e depois de completar 18 anos. Acrescentou que está em novo emprego e que pretende contrair núpcias, tão logo termine o processo. Em alegações finais, o Ministério Público requer a condenação nos termos da denúncia. Argumenta que o consentimento de menor de 14 anos não pode prevalecer. Requer, uma vez acolhida a pretensão acusatória, o indeferimento do recurso em liberdade, pois o acusado se evadirá do distrito da culpa e reiterará suas condutas, como ambos declararam em juízo. A Defensoria, a seu turno, pleiteia a absolvição, sustentando que há vínculo de afeto e que as relações sexuais foram consentidas. Ademais, o namoro era do conhecimento e consentimento dos genitores da ofendida. Destaca que a presunção do artigo 217-A do Código Penal deve ser relativizada para casos extremos como ora analisado, reconhecendo-se a atipicidade material do fato.


Considerando o problema apresentado, responda:


a) Interpretando a lição de Nelson Hungria: qui velle no potuit, ergo noluit, no crime de estupro, a vulnerabilidade deve ser considerada como absoluta ou relativa? O entendimento do citado autor estaria de acordo com a atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça na análise do tipo penal previsto no artigo 217-A do Código Penal?


b) O que parte da doutrina quer dizer quando, ao analisar o tipo penal citado, propõe: “o legislador atual elimina a figura da presunção e cria em seu lugar tipos penais autônomos”?

Resposta Nº 001827 por arthur dos santos brito


O artigo 217-A foi introduzido no Código Penal pela Lei n° 12.015/2009 e trata do estupro de vulnerável (manter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com  menor de 14 anos ou com que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência). O artigo 224 do CP tratava da violência presumida, o qual foi expressamente revogado pela Lei 12.015/2009, criando o legislador a condição de vulnerável (menos de 14 anos ou doente, sem o necessário discernimento ou sem capacidade de resistência).

Assim, para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no artigo 217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menos de 14 anos ou doente, sem o necessário discernimento ou sem capacidade de resistência (e sendo esta condição conhecida do agente).

Ainda que a vítima consinta com o ato sexual, este consentimento é nulo, sem qualquer valor jurídico, tratando-se, em verdade, de violência presumida, ficta ou indutiva. O legislador presume a violência, tendo em vista as circunstâncias concretas dentre das quais a vítima não pode, validamente, dar seu consentimento. Questão que ganhou destaque em razão da intensa polêmica jurisprudencial foi quanto a condição de vulnerável da vítima, ou seja, se o fator idade, pode ou nao ser usado como critério absoluto para a configuração do crime ou se pode - em razão das circunstâncias e das condições pessoais da vítima ser relativizado.

Esta discussão ganhou maior destaque a partir de alguns julgamentos ( da decáda de 80 em diante), no sentido de que as alterações da sociedade, aliado ao fato de que o Código Penal datava de 1940 - por tanto ultrapassado-, indicavam que a sociedade atual discrepava da lei penal e que nem todo menor de 14 anos necessitava de proteção legal (nem todo menor de 14 anos era necessariamente vulnerável). Após intensa discussão, o Supremo Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que sendo a vítima menor de 14 anos, o consentimento dela, sua eventual experiencia sexual anterior ou a existencia de relacionamento amoroso com o agente nao afastam a ocorrência do crime em hipótese alguma.

O adágio "qui velle no potuit, ergo noluit" (quem nao pode querer, quem nao pode consentir, dissente), passou a ser aplicado com rigor pela jurisprudência, sob o fundamento de a criança e o adolescente merecem proteção integral do Estado. Além disso, a sociedade e seus costumes evoluíram para não mais  aceitar e entender como normal a iniciação sexual de um infante, ao contrário disso, evoluiu a fim de dar proteção penal às crianças e adolescntes menores de 14 anos, evitando que se iniciem precocemente na vida sexual, quando ainda imaturos e despreparados para enfrentar todos os riscos e desdobramentos desta conduta (sem cuidado, sem qualquer tipo de prevenção).

Assim, operando grande alteração do título dos crimes contra a dignidade sexual, conforme pontua parte da doutrina, o legislador eliminou a figura da presunção (de vulnerabilidade) e criou, em seu lugar, tipos penais autônomos, tal como o crime do artigo 217-A considerando que na redação do revagado artigo 224 do Código Penal (antes da entrada em vigor da Lei n° 12.015/09), respondia por estupro ou por atentado violento ao pudor o agente que, mesmo sem violência real, e ainda que mediante anuência da vítima, mantivesse relações sexuais ( ou qualquer ato libidinoso) com menor de 14 anos e nas hipóteses dela contar com menos de 14 anos, incidia causa especial de aumento de pena. A partir da Lei 12.015/09, por meio do artigo 217-A o legislador criou um tipo penal autônomo para o vulnerável, incrementando a proteção penal (princípio da proteção integral) da criança e do adolescente.a

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