A interpretação das normas jurídicas é uma matéria que se desenvolveu em três etapas fundamentais: a) a obra de Friedrich Schleiermacher, no início do século XIX; b) a hermenêutica clássica de Savigny, na segunda metade do século XIX, e ainda preponderantes na Alemanha atual; c) a Nova Hermenêutica, no século XX. O magistrado tem como parte essencial de seu oficio a interpretação das normas e a coerência argumentativa de suas decisões. Nesse sentido, responda:
1) Quais os critérios hermenêuticos clássicos de Savigny e como se deve operacionaliza-los na interpretação?
2) Qual o papel da lei na interpretação da norma? É possível desconsiderá-la na interpretação? Por que?
O texto da lei sempre foi muito valorizado, razão pela qual o juiz era tido como “boca da lei” de modo que não lhe competia realizar qualquer tipo de interpretação.
Ocorre que nem sempre o texto da lei tornava possível a sua aplicação ao caso concreto, era necessário a criação de algum método que resolvesse esses problemas práticos de aplicação da lei.
Assim, Savigny desenvolveu alguns critérios hermenêuticos de modo a adequar o texto à realidade, viabilizando a interpretação mais adequada da lei de modo a extrair a norma.
Os critérios hermenêuticos clássicos desenvolvidos por Savigny são: critério gramatical, critério sistemático, critério histórico, critério sociológico e critério teleológico.
Pelo critério gramatical busca-se o sentido literal do texto legal; o critério sistemático traz a interpretação por meio da contextualização e consideração de todo o ordenamento jurídico, de forma sistêmica; o critério histórico busca o sentido da norma sob o momento histórico que vivia a sociedade; o critério sociológico está diretamente ligado à eficácia social, pois é necessário adequar a interpretação à realidade da sociedade sob pena de não produzir os efeitos esperados; já o critério teleológico busca a finalidade das normas, o fim buscado pelo legislador quando editou determinada lei.
Ocorre que esses métodos hermenêuticos clássicos não são mais suficientes para a interpretação da norma, principalmente após a Segunda Guerra Mundial que trouxe grande destaque aos direitos humanos e a dignidade da pessoa humana, valores estes que influenciaram a Constituição Federal de 1988.
A Constituição deixou de ser uma simples “folha de papel” (Lassalle), deixou de ser uma mera recomendação, uma mera carta política para ter força de norma no fenômeno chamado de Força Normativa da Constituição (Konrad Hesse). Ainda, na pirâmide de Kelsen a Constituição passou a figurar o topo de modo que todo o ordenamento jurídico deve estar de acordo com ela, ante a sua superioridade frente às demais normas jurídicas.
Assim, com influência do neoconstitucionalismo, texto passou a se diferenciar da norma, eis que a norma é a interpretação dada ao texto.
A interpretação passou a ser uma atividade criativa, pois que interpreta cria. Desta forma, o juiz passou a ter função criativa, já que cria a norma jurídica aplicável ao caso concreto que lhe foi submetido.
Houve desenvolvimento da aplicação da teoria dos direitos fundamentais, de modo que sua aplicação não se dá tão somente no âmbito vertical (Estado-particular), mas também no âmbito horizontal (particular-particular) e diagonal (particular-particular numa relação de desigualdade).
Os critérios de razoabilidade e proporcionalidade foram trazidos para a interpretação da lei, de modo a tornar a norma mais justa ao caso concreto.
Houve também mudança na técnica legislativa, posto que passou a adotar termos mais abertos, mais adaptáveis à evolução da sociedade, tornando-os mais duráveis (ex: clausulas gerais).
A lei pode ser usada na interpretação da norma, como exemplo, a LINDB (Decreto-lei 4657/42), a qual a doutrina chama de norma de sobredireito, eis que é uma norma que regula outras normas trazendo diversas regras de interpretação.
Uma lei pode sim ser desconsiderada à luz de um caso concreto, no momento de interpretá-la, pois, conforme acima mencionado, após a CF/88 diversos valores influenciados na dignidade da pessoa humana e na sistemática dos princípios constitucionais fundamentais podem fazer prevalecer ao teor da lei.
Ademais, é possível também, de forma extremamente excepcional, a aplicação do fenômeno da derrotabilidade que significa o afastamento episódico de uma norma válida e constitucional por ser incompatível ao caso concreto.
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