Antônio, auxiliar de serviços gerais de uma multinacional, nos dias de limpeza, passa a observar uma escultura colocada na mesa de seu chefe. Com o tempo, o desejo de ter aquele objeto fica incontrolável, razão pela qual ele decide subtraí-lo.
Como Antônio não tem acesso livre à sala onde a escultura fica exposta, utiliza-se de uma chave adaptável a qualquer fechadura, adquirida por meio de um amigo chaveiro, que nada sabia sobre suas intenções. Com ela, Antônio ingressa na sala do chefe, após o expediente de trabalho, e subtrai a escultura pretendida, colocando-a em sua bolsa.
Após subtrair o objeto e sair do edifício onde fica localizada a empresa, Antônio caminha tranquilamente cerca de 400 metros. Apenas nesse momento é que os seguranças da portaria suspeitam do ocorrido. Eles acham estranha a saída de Antônio do local após o expediente (já que não era comum a realização de horas extras), razão pela qual acionam policiais militares que estavam próximos do local, apontando Antônio como suspeito. Os policiais conseguem alcançá-lo e decidem revistá-lo, encontrando a escultura da sala do chefe na sua bolsa. Preso em flagrante, Antônio é conduzido até a Delegacia de Polícia.
Antônio, então, é denunciado e regularmente processado. Ocorre que, durante a instrução processual, verifica-se que a escultura subtraída, apesar de bela, foi construída com material barato, avaliada em R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais), sendo, portanto, de pequeno valor. A FAC (folha de antecedentes criminais) aponta que Antônio é réu primário.
Ao final da instrução, em que foram respeitadas todas as exigências legais, o juiz, em decisão fundamentada, condena Antônio a 2 (dois) anos de reclusão pela prática do crime de furto qualificado pela utilização de chave falsa, consumado, com base no artigo 155, § 4º, III, do CP.
Nesse sentido, levando em conta apenas os dados contidos no enunciado, responda aos itens a seguir.
A) É correto afirmar que o crime de furto praticado por Antônio atingiu a consumação? Justifique.
B) Considerando que Antônio não preenche os requisitos elencados pelo STF e STJ para aplicação do princípio da insignificância, qual seria a principal tese defensiva a ser utilizada em sede de apelação? Justifique.
a) O crime de furto praticado por Antonio foi consumado. O entendimento do STF quanto a consumação do furto é de que a posse tranqüila da “res furtiva” é dispensável, adotando a teoria da amotio ou aprehensio para a consumação do fruto.
b)Pleitear o reconhecimento do furto privilegiado, nos termos do §2ºs do Art. 155 do CP, o qual dispõe que poderá ser reconhecida a figura privilegiada caso o agente seja primário e a coisa furtada seja de pequeno valor. O entendimento dos tribunais superiores é de que o objeto furtado não poder ter valor superior ao do salário mínimo vigente na época do fato. É também entendimento dos tribunais superiores que a qualificadora do crime de furto, desde que de natureza objetiva, pode coexistir com a figura do furto privilegiado, gerando o furto híbrido, podendo o juiz, nessa situação, substituir a pena de reclusão pela a de detenção, diminuir a pena de um a dois terços ou aplicar somente a pena de multa.
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
22 de Agosto de 2019 às 22:49 Parquet por vocação disse: 0
Parabéns, colega! A resposta guarda pertinência com o gabarito da banca:
"A questão trata do crime de furto e busca extrair do examinando conhecimento específico sobre dois pontos
importantes acerca do tema: o momento consumativo do delito e a incidência do privilégio. A primeira indagação
tem cunho eminentemente teórico, enquanto a segunda é de caráter prático, pois exige que o examinando saiba
interpretar informações dadas no enunciado e, a partir delas, identificar a incidência do privilégio, o que será
capaz de reduzir significativamente a resposta penal a ser dada ao personagem da questão. Nesse sentido, para
fazer jus aos pontos relativos ao item “A” o examinando deve responder afirmativamente, indicando que o furto
atingiu a consumação. Com efeito, diversas teorias existem sobre o momento consumativo do crime de furto,
sendo certo que a predominante, tanto na doutrina quanto na jurisprudência dos Tribunais Superiores, é a Teoria
da Amotio, segundo a qual a consumação ocorre quando a coisa subtraída passa para o poder do agente, mesmo
que num curto espaço de tempo – tal como ocorreu no caso narrado -, independentemente de deslocamento ou
posse mansa e pacífica da coisa. Também merece destaque, embora não seja o entendimento majoritário,
reflexão sobre o momento consumativo do crime de furto narrado no enunciado com a adoção da Teoria da
Ablatio. Perceba-se que ainda assim a resposta seria a mesma: o furto foi consumado. Isso porque, para aqueles
que adotam a Teoria da Ablatio, o furto consuma-se quando o agente, depois de apoderar-se da coisa, consegue
deslocá-la de um lugar para o outro – fato que, da mesma forma, foi narrado no enunciado. Cabe ressaltar que a
Banca Examinadora, com o intuito de privilegiar a demonstração de conhecimento jurídico, aceitará como
justificativa correta ambas as fundamentações acima expostas, sem perder de vista que os Tribunais Superiores
adotam a Teoria da Amotio. Pelo mesmo motivo, entretanto, não será pontuada a resposta que traga apenas a
afirmativa “sim”, desprovida de qualquer justificativa ou mesmo com justificativa equivocada.
No tocante ao item “B”, para que receba a pontuação respectiva, o examinando deve indicar que de acordo com
a questão, desconsiderando a argumentação no sentido de aplicação do princípio da insignificância (que pelo
próprio enunciado afigura-se como inaplicável), a principal tese defensiva deve ser o reconhecimento do furto
qualificado e privilegiado (artigo 155, § 2º, c/c artigo 155, § 4º, III, ambos do CP). Isso porque a qualificadora da
utilização de chave falsa possui natureza objetiva, sendo compatível com o furto privilegiado, que é de ordem
subjetiva." Fonte: https://www.qconcursos.com/questoes-da-oab/provas/fgv-2014-oab-exame-de-ordem-unificado-xiii-segunda-fase-direito-penal