Mediante a revelação do atual modo de funcionamento de nossos sistemas jurídicos, os críticos oriundos das outras ciências sociais podem, na realidade, ser nossos aliados na atual fase de uma longa batalha histórica: a luta pelo acesso à justiça. Sem dúvida, uma premissa básica será a de que a justiça social, tal como desejada por nossas sociedades modernas, pressupõe o acesso efetivo.
Mauro Cappelletti e Bryant Garth. Acesso à justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988, p. 8 (com adaptações).
Um dos objetos de estudo da sociologia da aplicação do direito consiste nos obstáculos de acesso à justiça que grande parte da população enfrenta. Autores como Rehbinder e Raiser dividem as barreiras de acesso efetivo à justiça em quatro categorias: barreiras econômicas; barreiras sociais; barreiras pessoais; e barreiras jurídicas. Uma ulterior barreira jurídica constitui a falta de meios processuais adequados para determinados tipos de conflito. Para solucionar o problema do acesso desigual aos serviços jurídicos, muitos países realizaram reformas.
Ana Lucia Sabadell. Manual de sociologia jurídica: introdução a uma leitura externa do direito. 6.ª ed. São Paulo: RT, 2013, p. 197-8 (com adaptações).
Considerando que os fragmentos de texto apresentados têm caráter unicamente motivador, redija um texto acerca do acesso à justiça. Ao elaborar seu texto, discorra sobre
1 o conceito de ondas renovatórias de acesso à justiça, com enfoque nas inovações do sistema jurisdicional derivadas dessa ideia, e a relação desse conceito com os diferentes mecanismos de resolução de conflitos sociais;
2 o modelo multi-door justice, ou multi-door courthouse, abordando sua origem, seu conceito e a proposta de funcionamento relacionada aos diferentes mecanismos de resolução de conflitos sociais;
3 os órgãos recentemente implantados com a atribuição de realizar atividades de resolução de conflitos dentro da estrutura do Poder
Judiciário brasileiro.
O conceito de ondas renovatórias de acesso à Justiça está intimamente relacionado às diversas categorias de barreiras citadas no excerto extraído da obra de Ana Lucia Sabadell. Tais ondas renovatórias buscam derrubar ou, ao menos, mitigar tais obstáculos, propiciando um acesso mais amplo e mais efetivo à Justiça.
Nesse sentido, uma importante medida está, justamente, na cada vez maior aceitação e importância que se reconhece aos diferentes mecanismos de resolução de conflitos sociais, para além da tradicional solução jurisdicional, notadamente, a mediação e a conciliação. Essas duas figuras promovem verdadeiro acesso à Justiça, dado o seu caráter consensual, não se resumindo ao oferecimento de uma resposta ao problema apresentado, mas consubstanciadas em um verdadeiro trabalho de diálogo entre as partes adversas. Isso se verifica, sobretudo, na mediação, onde o foco está na busca da recuperação da relação social da qual se origina a demanda e que continuará a existir depois de resolvida a questão pontual, de modo que, se não recuperada a harmonia social, inevitavelmente, novas rusgas continuarão a surgir.
A concepção que se tem hoje do Judiciário e, porque não, que o próprio Judiciário tem de si mesmo, encontra tradução na noção trazida pelo modelo "multi-door". Isto é, o Judiciário deve funcionar como um local, figurativamente falando, onde desaguam as mais diversas demandas, as quais, contudo, não devem ser canalizadas numa única direção, ou seja, numa única via de solução. Ao contrário, é também papel do Judiciário, além da clássica tarefa de decidir, "dizendo o direito", encaminhar demandas de diferentes naturezas e que pedem distintas abordagens às diferentes portas possíveis, representantes dos diversos meios de solução de conflitos hoje reconhecidos.
Nessa linha, hoje se trabalha, em primeiro lugar, com dois grandes grupos de métodos de solução de conflitos, os autocompositivos e os heterocompositivos. Neste se encontram a prestação jurisdicional, de um lado, e a arbitragem, de outro. Já os métodos autocompositivos são representados, em especial, pelas figuras da mediação e da conciliação.
A arbitragem, regulamentada pela lei nº 9.307/96, tem, ainda hoje no Brasil, um caráter mais restrito, também porque particular, demandando o acordo entre as partes e a contratação de um árbitro ou câmara arbitral, o que pode torná-la cara para a maior parte das demandas, ainda que vantajosa para as demandas de vultosas montas. Também por isso, pelo seu caráter privado, não tem direta relação com a atuação do Poder Judiciário, funcionando mais como um substitutivo a ele.
Já a conciliação e mediação são instrumentos que podem ser utilizados autônoma ou incidentalmente em relação à prestação jurisdicional. Não por acaso o comando do art. 3º, §3º do CPC/15 que determina aos juízes e demais agentes do processo que fomentem a solução consensual do conflito, inclusive no curso do processo. Os conciliadores e mediadores, nos termos do art. 167, "caput", CPC/15, comporão cadastro nacional, o que não impede, conforme §6º do mesmo artigo, que os Tribunais optem por ter servidores concursados para o exercício de tais funções.
Outrossim, alguns tribunais têm criados setores ou núcleos de conciliação a compor, portanto, a estrutura do próprio Poder Judiciário, o que é de extrema valia, pois além de oferecer a resposta adequada aos diferentes tipos de lide, apresenta também a possibilidade de desafogo do Judiciário.
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
30 de Maio de 2023 às 22:00 MASP disse: 0
Dentro do proposto pela questão, a resposta deixou de trazer:
1 - o conceito de ondas renovatórias de acesso à justiça, com enfoque nas inovações do sistema jurisdicional derivadas dessa ideia, e a relação desse conceito com os diferentes mecanismos de resolução de conflitos sociais;
2 - a origem do modelo modelo multi-door justice, ou multi-door courthouse.