HABEAS CORPUS. FALSIDADE IDEOLÓGICA.
No caso, a hipótese não diz respeito, propriamente, à falsidade da identidade do réu, mas, sim, ao fato de o então indiciado ter faltado com a verdade quando negou, em inquérito policial em que figurava como indiciado, que tivesse assinado termo de declarações anteriores, que, assim, não seriam suas. Ora, tendo o indiciado o direito de permanecer calado e até mesmo o de mentir para não se autoincriminar com as declarações prestadas, não tinha ele o dever de dizer a verdade, não se enquadrando, pois, sua conduta no tipo previsto no art. 299 do Código Penal. Habeas corpus deferido, para anular a ação penal por falta de justa causa.
(HC 75.257-RJ; Rel. Min. Moreira Alves; 1.ª Turma do STF; DJ de 29/8/1997.)
Considerando que o texto acima tem caráter unicamente motivador, redija um texto dissertativo respondendo, justificadamente, ao seguinte questionamento: ao réu é concedido o direito de mentir?
Ao elaborar sua resposta, discuta
1 princípios jurídicos;
2 moral;
3 direito subjetivo.
Há relevante discussão acerca de ser possível ao réu mentir, a qual merece ser analisada à luz dos princípios constitucionais e processuais penais.
Os que defendem essa possibilidade sustentam com base no princípio da ampla defesa (art. 5º, LV, da CF), a qual deve ser exercida com os meios e recursos a ela inerentes. Dessa forma, a mentira do acusado, por ocasião de seu interrogatório, seria possível com base em aludido princípio.
Já para a corrente diversa, isso afrontaria o ordenamento jurídico. A mentira não estaria albergada pela ampla defesa. Há, de fato, o direito de não produzir provas contra si mesmo (“nemo tenetur se detegere”), ou seja, veda-se a autoincriminação, mas isso não autoriza ao réu apresentar informações inverídicas.
Tanto é verdade que o CPP prevê apenas o direito de permanecer em silêncio, não havendo permissão para a mentira.
Há de se apontar que o interrogatório é constituído de duas partes. A primeira tem por objetivo qualificar o réu e colher elementos sobre sua vida pessoal, personalidade, dentre outros. Nesta, não se admite o silêncio, porquanto não se está perquirindo-o acerca do fato. Já na segunda fase, em que se busca informações acerca do fato criminoso, pode o réu permanecer em silêncio.
Registre-se que o interrogatório é essencialmente um meio de defesa e, acidentalmente, meio de prova. A despeito disso, não pode ser assegurado o direito de mentir.
Com efeito, o processo penal deve buscar a verdade material, sendo dever das partes agir com boa-fé, nos termos do Novo Código de Processo Civil, aplicável analogicamente ao processo penal brasileiro, dentre as quais se inclui o acusado.
Embora não seja juridicamente aceita, a mentira não é tipificada como crime em nosso ordenamento jurídico. Em outros ordenamentos, porém, tipifica-se tal conduta como crime de perjúrio.
No âmbito da moral, aplicável ao Direito como um padrão mínimo ético de comportamento, nota-se igualmente o repúdio a tal ardil. O próprio réu, ao mentir, sofrerá uma sanção interior, típica da moral.
Dessa forma, não há direito subjetivo do réu em mentir. Trata-se de conduta não aceita no âmbito da Moral e do Direito. No entanto, não é dotada de sanção jurídica externa, haja vista não ser tipificado o crime de perjúrio em nosso ordenamento jurídico, mas é passível de sanção moral, já que corresponde a comportamento não tolerado pela maioria da sociedade.
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
17 de Outubro de 2020 às 17:56 JRepeat disse: 0
Ótima resposta, porém faltou comentar que a atribuição de falsa identidade, mesmo no contexto de autodefesa, é considerada crime (Súmula 522 do STJ).