Questão
MP/SC - 39º Concurso para Promotor de Justiça - 2014
Org.: MP/SC - Ministério Público de Santa Catarina
Disciplina: Direito Administrativo
Questão N°: 004

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Enunciado Nº 000884

Alegando insuficiência no quadro de pessoal e a existência de demanda reprimida em diversos programas e atividades do Poder Público, o Prefeito Municipal de Velhos Hábitos, JOÃO, determinou a deflagração de processo licitatório. Assim, em 26 de fevereiro de 2012, publicou-se na edição nº 295 do Diário Oficial Eletrônico do Município o extrato do Edital de Tomada de Preços nº 011/PMVH/2012, tendo por objeto a contratação de empresa especializada para desenvolver atividades de atendimento a pessoas inseridas em programas de assistência social, análises de projetos de edificação, contabilidade pública, organização administrativa e outras demandas de interesse público. A integralidade do edital só poderia ser acessada através do sítio da Prefeitura na rede mundial de computadores (www.pmvh.gov.br).


Processada a licitação, sagrou-se vencedora a única empresa inscrita e habilitada, a J. Ltda., controlada e presidida pelo empresário JOSÉ.


A partir da assinatura do termo de contrato, a J. Ltda. passou a fornecer para a Prefeitura profissionais das mais diversas áreas. Ao cabo de poucos meses, havia 120 trabalhadores com carteira assinada junto à J. Ltda. trabalhando para o Poder Público, nas funções de administrador, arquiteto, assistente social, contador, engenheiro e psicólogo.


Alertado, o Promotor de Justiça da Comarca instaurou inquérito civil em setembro de 2013 e constatou que havia candidatos aprovados em concurso público aguardando nomeação para todos os cargos cujas funções vinham sendo desempenhadas pelos contratados.


Apurou que a empresa alterara seu objeto em dezembro de 2011, passando de "comércio e representação de suprimentos de informática" para "fornecimento de mão de obra especializada, consultoria em administração pública, desenvolvimento de projetos de assistência social e análise de projetos de engenharia". Ampliara, na mesma oportunidade, seu capital social de R$ 10.000,00 para R$ 200.000,00, sendo 99% de suas cotas sociais titularizadas pelo empresário JOSÉ, militante no mesmo partido político que elegera o Prefeito JOÃO.


A partir de consultas a empresas e à Junta Comercial do Estado, bem como de depoimentos colhidos, verificou o representante do Ministério Público que não havia qualquer outra empresa da região que tivesse objeto compatível com o edital de licitação. Foi-lhe certificado que a íntegra do edital jamais esteve, de fato, disponível no sítio da Prefeitura Municipal.


Obteve, junto à ex-mulher de JOSÉ, o testemunho e a prova documental de que o empresário repassava mensalmente ao Prefeito JOÃO uma percentagem do lucro decorrente do contrato firmado. A quantia era depositada em uma conta de titularidade de JOÃO JR., menor impúbere e filho do Prefeito. A conta era por este controlada. Serviria, possivelmente, para custear a campanha de reeleição.


Através de depoimentos dos trabalhadores contratados, descobriu-se que sua admissão pela J. Ltda., para posterior disponibilização à Prefeitura, dependia invariavelmente de prévia seleção do Prefeito JOÃO. Ainda assim, não se verificou a existência de dolo ou má-fé por parte deles que, de modo geral, apresentaram-se como eleitores que haviam "pedido um cargo para o Prefeito".


A investigação mostrou-se bastante dificultada em face da resistência demonstrada pelo Prefeito JOÃO em atender às requisições do Ministério Público e do perceptível constrangimento dos contratados em prestar declarações na Promotoria de Justiça.


Com base nestes fatos, em 1º de julho de 2014 o Promotor de Justiça promoveu a ação judicial cabível no âmbito extrapenal.


Em sua defesa preliminar, o Prefeito JOÃO evocou a falta de interesse de agir do Ministério Público, uma vez que os fatos já tinham se submetido à análise do Tribunal de Contas do Estado e da Câmara Municipal, tendo sido aprovadas as contas do Município observando restrições meramente formais. O empresário JOSÉ, que neste ínterim havia assumido, como suplente, uma cadeira na Câmara dos Deputados, pediu o deslocamento da competência para o Supremo Tribunal Federal. No mérito, JOSÉ pleiteou o reconhecimento da prescrição da pretensão do Ministério Público, alegando que é servidor aposentado da Câmara Municipal e que desde a assinatura do termo de convênio já haviam se passado mais de 24 meses, lapso prescricional da pena de demissão segundo o Estatuto dos Servidores Públicos de Velhos Hábitos.


Diante disso, responda às seguintes questões:


a) colocando-se na posição do Promotor de Justiça autor da petição inicial, aponte os sujeitos passivos da ação e promova a subsunção do(s) fato(s) à(s) norma(s), identificando as condutas específicas perpetradas por cada agente e indicando os dispositivos a que elas correspondem na legislação pertinente. Considere que já foram adotadas as providências no âmbito criminal. Justifique e fundamente sua resposta;


b) além da aplicação das sanções cabíveis prevista na legislação pertinente, indique outro pedido que seria possível formular na ação proposta. Justifique e fundamente sua resposta;


c) aponte três medidas cautelares incidentais típicas, previstas na legislação específica, em tese cabíveis. Justifique e fundamente sua resposta;


d) tendo como parâmetro cada uma das teses de defesa apresentadas pelos réus, justifique e fundamente se elas procedem ou não.

Resposta Nº 003888 por Marco Aurélio Kamachi


Deverá compor o polo passivo da ação civil de improbidade o Prefeito João, nos termos do art. 1º da Lei 8429/92 em litisconsórcio com José, nos termos do art. 3º do mesmo diploma. O primeiro constitui o agente público que deu causa aos atos de improbidade, e o segundo o particular que concorreu e se beneficiou dos referidos atos.Poderá ainda ser acionada a sociedade J. Ltda., nos termos do art. 2º da lei 12846/13, conquanto se trate de ente que concorreu para o prejuízo da Adminstração. Não haverá prejuizo acerca da causa de pedir pois, a despeito da responsabilidade ser objetiva, a lide necessariamente passará pela analise subjetiva das pessoas naturais envolvidas.

Quanto as conduitas levadas a cabo, subsomem-se às hipóteses dos arts. 9, 10 e 11 da Lei 8429/92, pois a licitação fraudada causou evidente enriquecimento ilícito, dilapidou o erário público e atentou contra os princípios da administração pública.

O enriquecimento ilícito, que também importou em dano ao erário, restou consubstanciado na percepção de vantagem econômica pelo prefeito João e pelo comparsa José, através da repartição dos lucros pela J. Ltda, escamoteado mediante depósito na conta do filho menor do gestor da qual João detém movimentação, enquandrando-se na hipótese do inciso I do art. 9º da Lei de Improbidade.

O Dano ao Erário restou configurado pela conduta do Prefeito João, que através de licitação direcionada, restou por dilapidar o património do ente municipal, facilitando e concorrendo dolosamente para a incorpotação de verbas públicas ao patrimônio da J. Ltda, tudo nos termos do inciso I do art. 10 da LIA.

As condutas também violaram os princípios da Administração Pública (art. 37, caput CF), especialmente a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Restaram violados também princípios regentes do processo licitatório, notadamente o seu caráter concorrencial e isonômico. Inobservou-se o dever de publicidade do edital da tomada de preços, coforme determina a lei 12527/11. A licitação evidentemente foi direcionada à contratação da J. Ltda, o que se revela pelos seguintes fatores: prévia alteração do objeto social da J. Ltda, ausencia de concorrentes comerciais em razão da definição do objeto licitado, possível conhecimento do objeto em razão da proximidade entre João e José, notadamente por serem membros do mesmo Partido. Confirma-se, destarte, o incurso nas hipóteses dos incisos I, II, IV e V do art. 10 da LIA.

Sobre as sanções, nos termos do art. 12 da LIA, poderão ser aplicadas:

a) João - perda de bens e valores acrescidos ilicitamente, suspensão dos direitos políticos por até 10 anos, multa de até 3x o valor do acréscimo (art. 12, I).

b) José, além das penas acima, poderá ainda ser aplicada pena proibição de contratar com Poder Público por até 10 anos, conquanto seja sócio majoritário da empresa beneficiária.

c) J. Ltda. - poderá ser determinada a aplicação das penas do art. 19 da lei 12846/13, especificamente a perda de bens e valores auferidos ilicitamente (art.19,I), suspensão das atividades (art. 19, II), proibição de contratar com o Poder Público por 5 anos (art. 19, IV), bem como poderá cogitar-se da dissolução forçada (art. 19, III) eis fortes indícios da sua utilização para a promoção de atos ilícitos e ocultação dos beneficiários desses atos, conforme se dispõe o §1º do art. 19. 

Subsidiaria e eventualmente, não entendendo o magistrado pelas penas do inciso I do art. 12, poderá ser aplicadas em desfavor de João, as penas do inciso II, porquanto o ato de enriquecimento ensejou necessariamente dano ao erário. Em remota hipótese, remanesce como possível as penas do inciso III, pois houve nitida violação dos princípios da Adm. Pública.

Nos termos do art. 7º da LIA o MP poderá requerer, in limine littis, a aplicação da indisponibilidade de bens dos réus, bastando para tanto a demonstração de prova da materialidade e indícios de autoria da improbidade, pois nas pegadas do STJ o periculum in mora é presumido. O bloqueio poderá alcançar bens necessário a recuperação do produto do ilícito, a reparação do dano e eventual multa civil.

Poderá ainda ser determinado a investigação, bloqueio e sequestro de valores mantidos no exterior, conforme art. 16 da Lia. Outrossim, poderá ser requerido o afastamento cautelar de João do cargo de Prefeito de Velhos Hábitos.

Por sua vez, não prosperam as teses defensivas. Conforme decidiu o STF, a aprovação das contas pelo Tribunal de Contas não inibe o gestor da ação de improbidade. A preliminar de incompetência do juízo não se firma posto, conforme pacificado no STF e STF, o foro por prerrogativa só se impõe em matéria penal, devendo a ação de improbidade, por seu caráter civil, tramitar perante a primeira instância.

Sobre a prescrição, não consumou-se para qualquer dos réus. Para o prefeito João, os 5 anos somente se iniciam do término do mandato eletivo, termo que se estende ao concorrente particular José, bem como a J. Ltda.

 

 

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