Discorra sobre a seguinte assertiva: Com as últimas reformas legislativas, alguns artigos do CPP, com traços do sistema penal inquisitório, foram revogados ou alterados, mas persistem dispositivos em descompasso com o sistema constitucional acusatório.
A principal alteração recente no CPP quanto ao sistema das provas se deu pela lei 11.690/08, que reformulou vários dispositivos.
Para o STF, nosso sistema penal é considerado acusatório, mas há parte da doutrina e jurisprudência que apontam alguns traços do sistema inquisitório, razão pela qual sustentam ser o sistema "misto".
Talvez o exemplo mais emblemático seja o art. 156, que confere ao juiz poderes instrutórios, podendo determinar a produção, de ofício, antecipadamente no caso de provas urgentes e relevante, ou no curso da instrução, antes de sentenciar, para dirimir dúvida sobre ponto relevante. A crítica é que o ônus da prova no processo penal incumbe à acusação, devendo o juiz absolver no caso de dúvida, como decorrência do princípio in dubio pro reo como regra de julgamento, sendo as funções de julgar e acusar separadas (art. 5°, LIII, da CF). Já aqueles que advogam a constitucionalidade da previsão do art. 156, a exemplo de Nucci, defendem que o juiz deve buscar a verdade dos fatos, agindo com proporcionalidade, sem que isso viole o sistema acusatório (até porque para ele o sistema é misto).
Outro artigo que suscita discussão é o art. 212, que determina o sistema da inquirição direta das testemunhas, primeiro pelas partes e depois, se restarem pontos não esclarecidos, pelo juiz. A razão é a mesma e nesse caso há ainda um agravante, pois na prática é comum que os juízes façam a inquirição, para somente depois oportunizar às partes que o façam. Os tribunais superiores tradicionalmente não conhecem nulidade nisso, mas decisão recente do STJ entendeu em contrário. A crítica é que, além de violar o sistema acusatório, o juiz pode formular as questões de modo a conduzir o depoimento de forma tal que inviabilize a defesa, pois a regra geral é que a parte que arrolou deve inquirir em primeiro lugar, o que propicia a chance de conduzir o depoimento de acordo com sua tese (de acusação ou de defesa).
Vale mencionar, também, a nova redação do art. 400, que deslocou o interrogatório para a posição de último ato da instrução (e não mais o primeiro), o que prestigia o contraditório e ampla defesa (art. 5°, LV, CF). Não obstante, muitos procedimentos especiais, a exemplo da lei 11.343/06, prevêm como primeiro ato, o que foi referendado pelos Tribunais Superiores durante muitos anos, só vindo a ser alterado pelo Plenário do STF em 2017, após pacificar que em todos os procedimentos penais a ordem do art. 400 do CPP deve ser respeitada, inclusive no processo penal militar.
Assim, como visto, há ainda pontos de relevante discussão no CPP, considerados por muitos como resquícios do sistema inquisitório, incompatível com a Constituição Federal, mas que vêm pouco a pouco sendo adaptados à nova ordem a partir do incessante trabalho do legislador, da doutrina e da jurisprudência.
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