1. O
Banco GARANTIA S.A., nos autos de falência da empresa ABC LTDA, que tramita
ainda sob a égide da Lei 7.661/45, apresentou pedido de habilitação de crédito
correspondente a 4 cédulas e duas Escrituras Públicas de Confissão de Dívida
com garantias Hipotecárias, que totalizavam R$ 12.000.000,00 (doze milhões de
reais), corrigidos até a data do pedido de habilitação, segundo os cálculos que
apresentou com a inicial, cujos créditos estavam sendo então cobrados em seis
execuções distintas movidas contra a falida, no mesmo juízo, figurando o
habilitante como exequente e a falida como devedora, além dos outros
intervenientes garantes constantes dos mesmos títulos.
2. Instado a se manifestar sobre a
habilitação, o síndico da massa falida ABC LTDA. apresentou impugnação onde
alegou:
(a) nem todos os títulos cobrados foram
emitidos pela falida na condição de devedora principal, porque em quatro
cédulas participou como interveniente garante, pelo que haveria necessidade de
esgotar os meios de excussão patrimonial dos devedores principais, dois deles
sócios da falida, dois não, antes da realização da cobrança do crédito perante
a massa;
(b) que não houve proveito à massa em razão
de sua gratuita intervenção em dívida de terceiro e, além disso, não recebeu
qualquer numerário que pudesse ser objeto de habilitação no processo falencial
em curso;
c) extinção do processo, por falta de
interesse processual superveniente porque, depois do ajuizamento da presente
habilitação, o Banco GARANTIA S.A. cedeu e transferiu a totalidade de seu
crédito para ROBERTO CARLOS, terceiro que efetuou o pagamento, o qual é, assim,
o atual credor, incidindo na espécie os artigos 267-VI e 462 do CPC. Esse mesmo
fato implica também, se não pronunciada a falta de interesse processual, na
ilegitimidade ativa ad causam do BANCO GARANTIA S.A., que requer seja
reconhecida, pronunciando de igual forma a extinção do processo, com base nos
mesmos dispositivos legais.
d) preliminar de incompetência do juízo,
porque os créditos representados pelos títulos apresentados pelo BANCO GARANTIA
S.A. trazem juros remuneratórios superiores à taxa de 12% ao ano e são cobrados
encargos excessivos, como comissão de permanência cumulada com multa contratual
e juros moratórios, os quais, então, deveriam ser expurgados dos valores dos
contratos, e essas matérias devem ser discutidas na via própria e não na cessão
de crédito, daí nascendo a incompetência do juízo, razão pela qual deve ser
também extinto o processo sem a devida apreciação do mérito.
3. Comparece nos autos ROBERTO CARLOS,
salientando que efetivamente firmou com o sócio majoritário da massa falida
CAETANO VELOSO contrato que lhe garantia a condição de terceiro interessado
no pagamento de todos os haveres da devedora, quer os trabalhistas,
previdenciários e fiscais, quer os garantidos por direito real e
quirografários, tornando-se dela seu maior credor, sob a condição de que quando
fosse encerrada a falência, ser-lhe-á outorgada a transferência e registro da
empresa para seu nome.
Foi nessa condição, então, que efetuou o
pagamento do débito da massa falida junto ao BANCO GARANTIA S.A., dele
recebendo cessão de crédito mediante escritura pública que juntava aos autos,
sub- rogando-se, assim, em todos os seus direitos e ações e também nas
garantias hipotecárias, razões pelas quais requereu a substituição processual
do primitivo credor, prosseguindo a partir daí para que fosse habilitado como
sucessor do credor originário, em relação ao qual sub-rogou-se plena e
totalmente no crédito originário, nas cláusulas contratuais e nas garantias
contidas nos contratos atingidos pelos pagamentos que efetuou, nos termos dos
artigos 286 e 287 do Código Civil de 2002.
4. Foi determinada a oitiva do credor
habilitante, do síndico da massa falida e do sócio majoritário sobre o pedido e
documentos juntados pelo terceiro.
5. O BANCO GARANTIA S.A. manifestou-se para
dizer que recebeu realmente do terceiro a importância de seu crédito, dele
dando quitação em seu favor, fazendo-lhe a cessão de crédito para que
prosseguisse nos autos de habilitação, nos termos da escritura pública juntada,
que continha cláusula de cessão e transferência de todos os seus direitos de
crédito, quer em relação ao principal, quer em relação aos acessórios e
às garantias constantes dos contratos celebrados com a falida, pelo que
nada tinha a opor quanto ao pedido formulado.
6. A massa falida não impugnou a pretensão
de ingresso de ROBERTO CARLOS, mas sustentou que o valor do débito era de R$
12.000.000,00 e o pagamento efetuado foi de R$ 8.400.000,00, e este devia ser o
valor a ser considerado e não o principal e seus acréscimos, mesmo que
previstos na escritura pública de cessão de crédito.
7. O falido, à sua vez, apresenta
impugnação, dizendo que após a propositura do pedido inaugural, não mais era
possível a substituição das partes originárias sem que houvesse concordância de
todos os interessa- dos e, no caso, o falido estava se opondo à substituição
processual, razão pela qual a pretensão de ROBERTO CARLOS deveria ser
rejeitada, mantendo-se as partes originárias.
Alega, outrossim, que não foi notificado previamente da cessão
de crédito, cujo instrumento é nulo nos termos do artigo 290 do CC de 2002,
requerendo fosse assim declarado.
Sustentou a impossibilidade de tramitação
do pedido de habilitação de crédito, porque as execuções ainda se encontram em
curso, não tendo sido declarada a extinção dos processos, pelo que se configurava
a litispendência, impediente da fluência da habilitação proposta.
8. ROBERTO CARLOS, a quem se determinou
fosse ouvido sobre essas impugnações, afirmou que fez o pagamento do valor
constante da escritura pública, e os descontos por ele obtidos ocorreram em
razão do fato de que pagou à vista, em dinheiro, razão dos abatimentos dados
pelo banco. Mencionou que constava da escritura de cessão de direitos, em
destaque, na cláusula 2, que havia cessão da totalidade do crédito constantes
dos contratos originários, com transmissão plena dos direitos do Banco Garantia
S.A., incluindo as cláusulas contratuais relativas à forma de remuneração
do capital e seus encargos, e nas garantias reais constantes dos mesmos
contratos, o que era permitido pelos artigos 286 e 287 do CC de 2002.
Quanto à exigência do artigo 290 do mesmo
diploma civilista, afirmou que tanto o síndico da massa falida, quanto o
próprio falido, tinham conhecimento da cessão e não se opuseram ao pagamento
que se fez perante o Banco. Afirmou ainda que não era possível o sócio
desconhecer o pagamento das cédulas junto ao banco porque, como o próprio
falido reconhece, foi celebrado o contrato pelo qual ROBERTO CARLOS pagaria
todos os débitos da empresa falida, de qualquer natureza, sem quaisquer
restrições, não podendo alegar, assim, desconhecimento dos pagamentos efetuados
pelo terceiro interessado, com a posterior obrigação de transmissão das quotas
da empresa ao cessionário, requerendo, por isto, a aplicação da litigância de
má-fé.
Reafirmou o pedido de habilitação de seu
crédito como substituto processual do BANCO GARANTIA S.A, em toda sua extensão,
abrangendo o principal, os acessórios das cláusulas contratuais dos contratos
originários e as garantias reais ali existentes.
9. Depois do envio dos autos ao Ministério
Público, que afirmou não existir necessidade de sua participação no feito, os
autos foram então conclusos ao juiz.
Dispensado o relatório, elabore a sentença.
(Legislação) | Lei nº 11.101/2005 (Falência e recuperação judicial) |
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA