Sentença
Justiça Estadual
TJ/SP - 185º Concurso de Ingresso na Magistratura - 2014
Sentença Penal

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Enunciado Nº 000165

Examine o seguinte resumo de um processo-crime hipotético e elabore uma sentença penal nos moldes do art. 381 e s. do Código de Processo Penal.


I. TÍCIO, qualificado nos autos, foi denunciado como incurso nos artigos 33, caput, e 35, caput, e.e 40, inc. VI, todos da Lei n.º 11.343/2006 e CAIO, também qualificado nos autos, foi denunciado como incurso nos artigos 33, caput, e 35, caput, e.e art. 40, inc. VI, todos da Lei n.º 11.343/2006, e no art. 16, parágrafo único, inc. IV, da Lei nº 10.826/2003.


Consta da peça acusatória que:


"Em meados de 2013, neste Município e Comarca de São Paulo, Tício, Caio, o adolescente Mévio, então com 16 anos de idade, e outros dois indivíduos não identificados, associaram-se, de maneira estável e permanente, para a prática reiterada do tráfico de drogas.


Traçado o objetivo da societas sceleris, os indiciados, juntamente com o adolescente e comparsas foragidos, passaram a traficar drogas e, em janeiro de 2014, montaram na casa de número 10 da Rua da Pedra, Vila Bondade, neste município e comarca de São Paulo, um "ponto" de distribuição e venda de drogas.

[...]

No dia 12 de julho de 2014, por volta das 16 horas, na referida casa de número 10 da Rua da Pedra, Vila Bondade, São Paulo, após investigações e em cumprimento a mandado judicial de busca domiciliar, policiais do DENARC prenderam em flagrante os indiciados Tício e Caio, e apreenderam tanto o adolescente Mévio, quanto drogas, petrechos, arma de fogo municiada e outros objetos a seguir descritos.

[...]

Assim, no dia 12 de julho de 2014, na aludida casa de número 10 da Rua da Pedra, Vila Bondade, São Paulo, Tício, Caio e o adolescente Mévío, associados a outros dois indivíduos ainda não identificados, tinham em depósito e guardavam, para fins de comércio e entrega ao consumo de terceiros: 327,0 g (trezentos e vinte e sete gramas - peso líquido) de cocaína em pó (acondicionada em 82 "papelotes" e 73 eppendorfs, e o restante em porção única num saco plástico); 136,0 g (cento e trinta e seis gramas - peso líquido) de crack (dividido em 247 "pedras" embaladas individualmente e o restante acondicionado num saco plástico) e 284,0 g (duzentos e oitenta e quatro gramas - peso líquido) de Cannabis Sativa L, conhecida por maconha (acondicionada em 28 "trouxinhas" e o restante em porção única num saco plástico), substâncias entorpecentes que determinam a dependência física e psíquica, e o faziam sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, conforme autos de exibição e apreensão de fls., autos de constatação de fls. e s. e laudos de exame químico-toxicológico que serão oportunamente juntados aos autos. Tudo foi apreendido por investigadores de polícia do DENARC.


Naquela oportunidade, os policiais civis também apreenderam na referida casa uma balança digital de precisão, duas tesouras, três colheres e dois pratos de medição, tudo com resquícios de cocaína, além de cerca de uma cen­tena de saquinhos plásticos transparentes e cerca de uma centena de tubos tipo eppendorf vazios, utilizados para embalagem e distribuição das drogas. Também apreenderam ali a quantia de R$ 4.938,00 (quatro mil, novecentos e trinta e oito reais) em cédulas e moedas, produto do tráfico.


Na bolsa tipo pochete, usada por Caio, os policiais também apreenderam um revólver Taurus, calibre 38, com numeração de série raspada, devidamente municiado com seis balas intactas; um celular marca Samsung e a chave da motocicleta Honda CG 150 Titan Mix, ano 2013, placa XXX 000, que foi apreendida na garagem da casa e cujo documento de propriedade estava em nome de Caio. Destarte, Caio possuía e portava arma de fogo com numeração raspada, devidamente municiada, e o fazia sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

[...]"


II. Encontram-se encartados nos autos do processo:


a) o auto de prisão em flagrante de fls.;

b) boletim de ocorrência de fls.;

c) decisão fundamentada de conversão das prisões em flagrante em preventivas, entendendo o magistrado que se encontravam presentes os requisitos constantes do art. 312 do CPP, e que se revelavam inadequadas e insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão;

d) auto de exibição e apreensão das drogas apreendidas a fls.;

e) auto de exibição e apreensão dos instrumentos e objetos apreendidos a fls.;

f) auto de exibição e apreensão da motocicleta e celular apreendidos a fls.;

g) auto de exibição e apreensão da quantia de R$ 4.938,00 (quatro mil, novecentos e trinta e oito reais) em cédulas e moedas a fls.;

h) auto circunstanciado da busca domiciliar (art. 245, § 7º, CPP) a fls.;

i) laudos (positivos) da eficácia vulnerante da arma de fogo e respectivas munições, confirmando a raspagem da numeração da arma a fls.;

j) autos (positivos) de constatação das drogas apreendidas a fls.;

k) laudos (positivos) de exames químico-toxicológicos das drogas apreendidas a fls.;

l) laudos periciais (positivos) da balança, instrumentos e demais objetos apreendidos a fls.;

m) auto de incineração das drogas apreendidas a fls. (com reserva de contraprova) a fls.;

n) mídias gravadas (em CDs) contendo os depoimentos das testemunhas e os interrogatórios dos acusados;

o) decisão de indeferimento da realização de exame de dependência toxicológica requerido por Tício por entender o magistrado que não havia indícios de inimputabilidade ou semi-imputabilidade - fls.;

p) termo de declarações do adolescente Mévio na Vara da Infância e da Juventude a fls.


Também constam dos autos:


1. certidão cartorária judicial de condenação de Caio, por infração à norma penal contida no art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/2006, à pena de 05 anos e 10 meses de reclusão, mais 583 dias-multa, com trânsito em julgado para o Ministério Público, ainda pendente de recurso da Defesa - fls.;

2. certidão cartorária judicial da condenação de Caio, por "roubo qualificado tentado", à pena de 2 anos e 8 meses de reclusão, mais 6 dias-multa, com trânsito em julgado definitivo aos 10 de outubro de 2012 a fls.;

3. "F.A." de Caio da qual constam registros de inquéritos policiais por tráfico de drogas, porte ilegal de arma de fogo e roubo - fls.;

4. qualificação de Tício dando conta de que quando dos fatos ele tinha 20 anos de idade a fls.:

5. "F.A." de Tício da qual "nada consta" - fls.;

6. certidões cartorárias judiciais circunstanciadas relativas aos antecedentes infracionais do adolescente Mévio dando conta da aplicação de medidas socioeducativas atinentes a furto e roubo - fls.


IlI. Oferecida a denúncia, o juiz determinou a notificação dos acusados para oferecimento das defesas prévias por escrito, peças que se encontram a fls. Recebida a denúncia (fls.), o juiz designou a audiência de instrução e julgamento, ordenou a citação pessoal dos acusados, a intimação do Ministério Público, e requisitou os laudos periciais. Aberta a audiência de instrução e julgamento sem quaisquer requerimentos, após os interrogatórios dos acusados e as inquirições das testemunhas arroladas pela Acusação (não foram arroladas testemunhas pelas Defesas), foi dada a palavra, sucessivamente, ao representante do Ministério Público e aos defensores dos acusados, para sustenta­ ção oral. Encerrados os debates, o juiz determinou que os autos lhe fossem conclusos para sentença.


IV. Interrogado em Juízo (fls.), Caio disse que não conhece nem o corréu, nem o adolescente Mévio, nem a tal casa; que ignorava a existência das drogas, da arma de fogo e "outras coisas" referidas na denúncia; que apenas passava pelo local com sua motocicleta, rumo ao trabalho, quando foi abordado pelos policiais - a quem não conhe­cia - e levado para dentro daquela casa, onde nunca estivera antes; que, lá estando, viu os materiais que os policiais disseram tratar-se de drogas, oportunidade em que disseram que ali funcionava um "ponto" de venda de drogas; que nunca andou armado e não sabe de "onde surgiu" o tal revólver; que é inocente e que está sendo injustamente acusado.


V. Interrogado em Juízo (fls.), Tício confessou as práticas delituosas, afirmando que conheceu o corréu há cerca de um ano; que a ele foi apresentado por um conhecido em comum logo que "chegou do interior" ; que Caio disse que "trabalhava" no tráfico e convidou o interrogando para ajudá-lo; que, por estar desempregado, sem dinheiro e "meio perdido" em São Paulo, aceitou o convite; que também vieram "trabalhar' nesse "negócio" o adolescente Mévio e mais dois indivíduos - "Pedrão" e "Zé Batista"-, cujas qualificações e paradeiros ignora; que Caio tinha um fornecedor de drogas no interior do Estado; que alguns meses mais tarde montaram um "ponto" naquela casa, que Caio alugou para este fim; que chegava a ganhar até R$ 2.000,00 por mês com o tráfico; que o dinheiro que os policiais ali encontraram era produto da venda das drogas; que o "ponto era bom", pois tudo que "embalavam" era vendido; que, por vezes, também vendiam drogas fora dali, naquela região; que a arma de fogo apreendida pertencia a Caio, pois há cerca de dois meses ele havia recebido o revólver como pagamento por "uns papelotes" e costumava andar armado "só por segurança" ; que a motocicleta apreendida havia sido comprada por Caio e por Mévio há cerca de quatro meses com dinheiro do tráfico e, por vezes, era usada para "fazer entregas de papelotes" ; que "de vez em quando dá uns tapas" , i.e., faz uso recreativo de maconha; que está arrependido do que fez e resolveu contar a verdade porque tem apenas 20 anos de idade, está só, acredita que Caio "vai dar um jeito de se safar disto tudo", o adolescente Mévio "não vai ficar preso" e os outros rapazes conseguiram "sair fora fugindo".


VI. Em suas declarações prestadas na Vara da Infância e da Juventude, o adolescente Mévio disse que há cerca de um ano foi chamado por Caio para "trabalhar no tráfico" juntamente com os demais; que Caio tinha "uns fornece­dores" no interior do Estado e vendiam drogas na região, até que o "negócio" começou a "dar dinheiro" e resolveram alugar a casa para montarem "uma biqueira"; que cada um ficava com parte do dinheiro da venda das drogas e "a bocada era bem boa". Depois que "entrou para o tráfico" começou a ganhar seu próprio dinheiro, parou de estudar e saiu de casa porque seu pai "não admitia essa vida" .


VII. Os investigadores de policia do DENARC - Rodney M.C. e Mariano P.R. - disseram, de modo harmô­nico e detalhado em Juízo (tis.), que não conheciam nem os acusados nem o adolescente Mévio, mas já vi­nham investigando a ação de uma quadrilha de traficantes que agia naquela região e, por informações anôni­mas, souberam que na aludida casa havia "movimentação suspeita de pessoas estranhas", inclusive, durante a noite. De posse dessas informações, por determinação superior, os policiais montaram campana ali perto e pu­deram observar um "entra e sai" de pessoas em horários variados, aduzindo que chegavam de carro, de moto ou mesmo a pé. Puderam observar que ora eram recebidas por Tício, ora por Caio, ora pelo adolescente, ora pelos outros dois indivíduos que não puderam identificar. Mantiveram essa vigília por cerca de uma semana, observando que tanto os acusados, quanto seus comparsas entravam e saiam livremente daquela casa e que, quando o faziam, olhavam para os lados, como se "fizessem algo errado" . Por vezes, eles usavam "umas bolsas" e uma motocicleta. As pessoas que entravam e saíam da casa rapidamente pareciam apreensivas. Narra­ram esses fatos para a Autoridade Policial, que conseguiu um mandado de busca e apreensão. Munidos dessa ordem judicial, ingressaram naquela casa onde se encontravam os dois acusados, o adolescente e mais dois rapazes que conseguiram fugir. No térreo havia uns poucos móveis e sobre uma mesa havia alguns "papelotes e tubinhos de cocaína e de crack'', algumas "trouxinhas de maconha" e uma balança digital; dentro de um armário apreenderam cerca de cinco mil reais em "dinheiro miúdo"; na pochete de Caio apreenderam um revólver calibre 38 municiado e "raspado", um celular e a chave de uma moto que estava na garagem e pertencia a ele; que no andar de cima havia umas camas e armários, onde apreenderam as drogas: cerca de 300 g de cocaína em pó; 100 g de crack, e 250 g de maconha; que ali também havia umas tesouras, colheres e pratos com resquícios de pó branco, além de embalagens plásticas e tubinhos vazios; que cerca de metade das drogas já estava embalada em "papelo­tes, trouxinhas e tubinhos" e o restante estava em sacos plásticos; que tudo foi apreendido e levado ao DENARC; que os acusados e o adolescente tentaram correr para os fundos, mas foram contidos, porém, os outros dois rapazes que lá estavam lograram correr e fugiram pela porta dos fundos, pulando o muro, não sendo mais localizados: que Caio parecia calmo e disse que estava lá apenas de passagem e nada tinha que ver com aquilo tudo; que o ado­lescente também parecia tranquilo e nada disse; que Ticio ficou bastante nervoso, começou a "gaguejar" e contar que estavam traficando, mas acabou silenciando, visivelmente por medo do comparsa; que os policiais tiveram o cuidado de chamar vizinhos para que presenciassem a diligência, sendo que tais pessoas confirmaram que os dois acusados, o adolescente e outros rapazes "já agiam ali" há cerca de seis meses.


VIII. Em juízo também foram ouvidas as testemunhas André V.D. e Pedro H.B., que disseram que moram em casas próximas e que foram chamados pelos policiais para entrarem na tal casa, onde havia substâncias e materiais que os investigadores disseram tratar-se de drogas e "coisas" relativas ao tráfico. Disseram que há cerca de seis meses havia "um entra e sai' de pessoas estranhas naquela casa e que os dois acusados e o adolescente estavam sempre ali. Não souberam dizer a quem pertencia aquela casa, mas disseram que ela ficou desabitada por algum tempo antes dos acusados ali se estabelecerem. Por fim, disseram que aquela movimentação de pessoas no local era muito estranha e havia comentários na região de que ali funcionava uma "boca do tráfico de drogas" , aduzindo que estão temerosos por suas seguranças, pois sabem que alguns envolvidos fugiram.


IX. Em suas considerações finais, o Ministério Público pede: a) a condenação de TÍCIO como incurso nos artigos 33, caput, e 35, caput, e.e art. 40, inc. VI, todos da Lei n.º 11.343/2006, em concurso material; b) a condenação de CAIO como incurso nos artigos 33, caput, e 35, caput, e.e art. 40, inc. VI, todos da Lei n.º 11.343/2006, e no art.16, parágrafo único, inc. IV, da Lei n.º 10.826/2003, em concurso material; c) a fixação das penas-base em patamares acima do mínimo ante a quantidade e variedade das drogas; d) o regime inicial fechado para inicio de cumprimento das penas; e) a vedação de benefícios de quaisquer naturezas; f) o perdimento dos bens e valores apreendidos; g) o reconhecimento da "hediondez" do crime de "Associação para o Tráfico".


X. Em sua Sustentação Oral, a Defesa Constituída de CAIO requer, preliminarmente, a nulidade do feito por inobservância do procedimento comum ordinário previsto no CPP ante a conexão do crime de porte ilegal de arma de fogo (rito comum ordinário) e o tráfico e a associação para o tráfico (rito especial). No mérito, postula a absolvição por insuficiência de provas da autoria, máxime por escorar-se o Ministério Público em depoimentos suspeitos dos policiais envolvidos na prisão. Subsidiariamente, pede: a) o afastamento da causa de aumento prevista no art. 40, inc.VI, da Lei n.º 11.343/2006 porque o adolescente Mévio "já era corrompido" quando dos fatos; b) a absolvição no tocante ao art.16, parágrafo único, inc. IV, da Lei n.º 10.826/2003 por atípicidade da conduta porque o revólver apreendido não configura arma de uso proibido ou restrito e, se for o caso, que este fato seja considerado como causa de aumento prevista no art. 40, inc. IV, da Lei n.0 11.343/2006; c) o afastamento da "Associação para o Tráfico" pois não restou demonstrado qualquer ânimo associativo permanente entre os agentes, mesmo porque, alguns deles sequer foram identificados e um deles era inimputável, ou, alternativamente, a absorção desta infração pelo tráfico de dro­gas; d) a causa de redução prevista no art. 33, § 4.0 , da Lei n.º 11.343/2006; e) a fixação da reprimenda no patamar mínimo; f) o regime inicial aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos; g) a dispensa do pagamento das multas previstas na Lei n.º 11.343/2006 por serem inconstitucionais ao ferirem o princípio da razoabilidade; h) a concessão da liberdade provisória; i) a liberação da sua motocicleta.


XI. Já a Defesa Constituída de TÍCIO, em sede de preliminar, arguiu a nulidade do feito por cerceamento de defesa, eis que o Magistrado indeferiu a realização do exame de dependência toxicológica por ele requerido (arts. 45 e 46 da Lei Antidrogas). No mérito, postula sua absolvição invocando a dirimente da "obediência hierárquica" a Caio. ou mesmo, a causa supralegal de exclusão da culpabilidade da " inexigibilidade de conduta diversa". Subsidiariamente pleiteia: a) a absorção da "associação" (art. 35, caput) pelo "tráfico" (art. 33, caput); b) a desclassificação da imputação de tráfico para o art. 28 da lei especial; c) o beneficio do "redutor" pelo que chamou de "tráfico privilegiado"; d) a causa de diminuição de pena da "cooperação de menor importância"; e) o reconhecimento das atenuantes genéricas da menoridade e da confissão, com fixação das penas-base em patamares inferiores ao mínimo legal; f) a fixação do regime inicial aberto; g) a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos; h) o direito de recorrer em liberdade; i) a restituição do dinheiro apreendido.

Resposta Nº 005532 por NSV


Relatório

Trata-se de ação penal pública incondicionada proposta em desfavor de Caio e Tício, ambos devidamente qualificados nos autos, pela prática, em tese, dos delitos descritos nos art. 33, 35 e 40, VI, lei 11.343/11 (lei de drogas - LD) e também art. 16, parágrafo único, IV, lei 10.826/03, por parte de Caio.  

Os réu foram presos em flagrante delito e, com fundamento no art. 312, do Código de Processo Penal (CPP) ambas as prisões foram convertidas em preventiva.

A denúncia, que deixo de transcrever para evitar tautologia desnecessária, fazendo, deste modo, parte integrante da presente sentença, foi ofertada em __/__/__. Nos termos do art. 55, lei 11.343/06, os acusados foram intimados para apresentar defesa prévia.

A denúncia foi recebida e os acusados citados. Apresentada a defesa, não sendo o caso do art. 397, CPP, designou-se audiência de instrução e julgamento (art. 397, CPP), ocasião em que os réus foram interrogados, as testemunhas da acusação foram ouvidas e foi dada a palavra, sucessivamente, ao representante do Ministério Público e aos defensores dos acusados (art. 57, Lei n. 11.343/06).

Vieram os autos conclusos. Passo a fundamentar e decidir.

MÉRITO

Em sua sustentação oral a defesa de Caio alegou preliminar de nulidade do feito, por não ter sido respeitado o procedimento comum ordinário, ante a denúncia de porte ilegal de arma de fogo de uso restrito (art. 16, parágrafo único, IV, l. 10.826/03). REJEITO a preliminar aventada, pois a Lei de Drogas é procedimento especial mais favorável ao acusado, devendo, portanto, ser adotada a lei específica, embora hajam crimes conexos que não sejam da referida lei. Outrossim, não foi arguido qualquer prejuízo, o que, por si só, seria o bastante para rejeitar o alegado (art. 563, CPP).

Também deve ser REJEITADA a prelimar arguida por Tício, pois, conforme aduzido em seu interrogatório, fazia uso esporádico de substância psicoativa de forma recreativa, não se enquandrado, portando, nas hipóteses dos art. 45 e 46, LD.

Tendo o feito tramitado de forma válida e regular, passo a análise das condutas imputadas aos réus.

A materialidade do delito de tráfico de drogas (art. 33, LD) está amplamente demonstrada, em especial, pelo (a) auto de prisão em flagrante; (b) auto de apreensão das drogas e dos petrechos para sua comercialização; (c) laudo químico-toxicológico; (d) auto de busca domiciliar; (e) pelos laudos periciais do petrechos apreendidos; e (f)  pelo depoimento dos policiais que participaram da diligência de prisão em flagrante, das testemunhas, do menor apreendidos e do réu Tício.

A autoria é inconteste, pois os réus foram presos em flagrante delito em posse das drogas, com petrchos para comercialização em local reconhecidamente tido como ponto de venda de substâncias entorpecentes. Além disso, Tício em seu interrogatório confessou a prática do delito, fornecendo todos os detalhes da empreitada criminosa, embora Caio tenha alegado inocência. Do mesmo modo e de forma coerente como o aduzido por Tício, Mévio prestou suas declarações na Vara de Infância e Juventude. Os policiais e as testemunhas corroboraram todo o acervo probatório, não havendo qualquer fundamentou ou prova que corrobore o alegado por Caio.

Quanto ao depoimento dos policiais, não há impedimento na sua utilização para a formação da convicção do Juízo, eis que são servidores públicos dotados de fé pública. Além disso, não foi apresentada qualquer prova que infirmasse os testemunhos realizados, sendo este ônus do réu (art. 156, CPP). Em arremate, observa-se que os testemunhos estão em consonância com as demais provas produzidas nos auto, não havendo que se falar em absolvição por ausência de provas.

Indefiro o pedido de desclassificação do delito para o art. 28, LD, em razão de o réu Tício ter confessado que, além de usar as substâncias, tinha em depósito, preparava, vendia e fornecia drogas à terceiros, praticando os núcleos do tipo do art. 33, LD. \

Na mesma senda, indefiro o pedido de exclusão de culpabilidade com base na obediência hierarquica e absolvição com fulcro em inexibilidade de conduta diversa, pois o Mévio confessou  (1) que foi convidado (não coagido) a participar da empreitada criminosa; (2) auferia benefício financeiro com o ilícito, motivo pelo qual participava da prática dos delitos; e (3) foi contra a ordem de seus genitores, que o expulsaram de casa em razão dos ilícitos perpetrados.

Pelos mesmos fundamentos supradelineados, tem-se que a materialidade e autoria do delito de associação para o tráfico (art. 35, LD) estão presentes. Com efeito, Tício, Mévio e as testemunhas que são vizinhas do local onde as drogas foram apreendidas, afirmaram que há cerca de 6 (seis) meses, pelo menos, ocorre a traficância pelos dois acusados e pelo adolescente apreendido. Tício confessou foi convidado a auxiliar Caio no "trabalho" e que a casa foi alugada com o fim especial de instalar ponto de venda de drogas e que o "negócio" rendia lucros para os participantes. Deste modo, verifica-se que os réus se associaram com o fim específico de comercializar a droga e de forma permanente, preenchendo os requisitos para a configuração da infração do art. 35, LD.

Indefiro o pedido de absorção do delito de associação pelo delito de tráfico, na medida em que são crimes autônomos, que tutelam bens jurídicos diversos, com consumação em momentos distintos. Do mesmo modo, indefiro o pedido de reconhecimento de sua hediondez, pois, nos termos da Constituição Federal (CF), da Lei 8.072/90, bem como da jurisprudência dos Tribunais de Justiça e das Cortes Superiores, a associação para o tráfico não é hediondo.

Indefiro, também, o pedido de absolvição pelo delito de associação em razão da menoridade de Mévio, pois, nos termos da jurisprudência consolidada neste E. Corte, a participação do menor pode ser considerada para fins de aferição do preenchimento dos requisitos para a configuração do crime tifipicado no art. 35 da Lei de Drogas.

A materialidade do delito de posse ilegal de arma de fogo de uso restrito (art. 16, parágrafo único, IV, lei 10.826/03) restou  caracterizada pela apreensão do artefato, que foi submetido à perícia técnica atestando sua eficácia; pelo auto de prisão em flagrante; pelo auto de apreensão, bem como pelo depoimento de Tício e dos policiais que participaram da diligência.

A autoria é indende de dúvidas, pois a arma foi apreendida na posse de Caio, tendo o corréu Mévio declarado que a arma foi adquirida como forma de pagamento pela traficância cerca de dois meses antes da prisão. Sendo o fato descrito em norma penal incriminadora, não há que se falar em atipicidade da conduta. Também não pode ser considerado como causa de aumento de pena (art. 40, IV, LD), porque a arma era utilizada para segurança pessoal do acusado e não para praticar o crime de tráfico ilícito de entorpecentes. 

Tício confessou os crimes cometidos e contava com 20 (vinte) anos à época dos fatos, sendo cabível a reconhecimento das respectivas circunstâncias atenuantes (art. 65, I e III "d", Código Penal - CP; c/c súmulas 74 e 545, Superior Tribunal de Justiça (STJ). Caio é reincidente (art. 61, I, CP), conforme se infere de sua folha de antecedentes (tentativa de roubo qualificado). Ações penais em curso e inquéritos policiais não servem para fins de reinicidência, tampouco para exasperar a pena base (súmula 441, STJ).

Considerando que os acusados se associaram para o cometimento dos crimes; contavam com a participação de menor e retiravam do tráfico valores para sustento próprio, incabível o reconhecimento da causa de diminuição de pena do art. 33, §4º, LD, nos termos do entendimento jurisprudencial firmado. A presença do menor, situação de conhecimento dos réus, atrai a incidência da causa de aumento do art. 40, VI, LD, em nada influenciando a informação de que já estava corrompido, eis que se trata de delito formal, ou seja, independente de resultado. 

Não se aplica a causa de diminuição de pena do art. 41, LD, porque a simples confissão da prática delitiva não preenche, por si só, os requisitos elencados para a concessão do referido benefício. Com efeito, embora conste dos autos a informação que dois agentes fugiram da cena do crime, o réu Mévio não forneceu elementos que permitissem sua identificaçãou ou a identificação do fornecedor das drogas. A confissão realizada apenas corroborou o acervo probatório produzido.

Os fatos são típicos, ilícitos e os réus culpáveis. Sendo as provas robustas, a condenação é medida que se impõe, motivo pelo qual passo à dosimetria das penas pelo método trifásico (art. 68, CP), de forma conjunta, pois, segundo entendimento do STJ, tal não configura, por si só, violação ao art. 5º, XLVI, CF.

A culpabilidade dos réus é normal à espécie;  os réus não ostentam maus antecedentes, não servindo a reinicidência de Caio como fundamento para exasperação da pena base, sob pena de "bis in idem", o que é vedado pela súmula 241, STJ; não foram produzidos elementos que permitissem aferir a conduta social ou a personalidade dos indivíduos;  os motivos dos crimes são ínsitos (lucro fácil para os delitos relacionados às substâncias psicoativas); as circunstâncias dos crimes são normais à espécie, não cabendo valoração da participação do menos na traficância, eis que já foi objeto de maior reprovabilidade pelo legislador na terceira fase da dosimetria; as consequências não destoam do esperado e não há que se falar em comportamento da vítima, na medida em que se tratam se crimes vagos. A natureza da droga é circunstãncia negativa, haja vista que foram apreendidos três tipos, sendo duas delas com alto poder de causar dependência (crack e cocaína); a quantidade é circunstãncia neutra, pois, embora acondicionada em diversas embalagens individuais, o total de substância apreendida não chegou a um quilo. 

Assim, fixo a pena base de

(1) Caio em 9 anos de reclusão 900 dias-multa para o delito do art. 33, LD; em  5 anos, 9 meses e 10 dias de reclusão e 800 dias-multa para o delito do art. 35, LD; e 3 anos, 4 meses e 6 dias de reclusão e 53 dias-multa; e

(2) Tício em 7 anos de reclusão e 700 dias-multa para o delito do art. 33, LD; e em 4 anos, 4 meses e 20 dias de reclusão e 700 dias-multa para o delito do art. 35, LD.

Não há nos autos elementos acerca da condição socioeconômica dos réus, motivo pelo qual fixo o valor do dia-multa no mínimo legal, qual seja 1/30 (art. 43, LD c/c 49, CP). Não tendo havido declaração de inconstitucionalidade das multas fixadas pela lei penal, indefiro o pedido de não aplicação. Com base no fundamento acima delineado, indefiro o pedido de fixação das penas base no mínimo legal.

Na segunda fase da dosimetria incide uma agravante para Mévio e duas atenuantes para Caio. Com fundamento na súmula 231, STJ, bem como nos art. 61 e 65, ambos do CP, fixo as penas intermediárias de

(1) Caio em 10 anos e 6 meses de reclusão e 1.050 dias-multa para o delito do art 33, LD; em 6 anos, 8 meses e 11 dias de reclusão e 933 dias-multa para o delito do art. 35, LD; e 3 anos, 10 meses e 26 dias de reclusão e 61 dias-multa; e 

(2) Tício em 5 anos de reclusão e 500 dias-multa para o delito do art. 33, LD; e 3 anos de reclusão e 700 dias-multa para o crime do art. 35, LD.

Na terceira fase incide para ambos os réus as causas de aumento do art. 40, VI, LD, com relação aos delitos da mencionada lei especial, de modo que, com o aumento mínimo de 1/6, as penas definitivas para cada um dos delitos fica em 

(1) 12 anos e 3 meses de reclusão e 1.226 dias multa para o delito do art. 33, LD; e 7 anos, 7 meses e 22 dias de reclusão e 1.088 dias multa para o delito do art. 35, LD para Caio. Confirmo a pena de 3 anos, 10 meses e 26 dias e de reclusão e 61 dias-multa para o crime do art. 16, lei 10.826/03; fixo regime inicial fechado para cada um dos três delitos, haja vista as circusntâncias negativas da primeira fase, a reincidência do réu e o quantum de pena (art. 33,§2º, c, CP); e

(2) 5 anos e 10 meses de reclusão e 583 dias-multa para o crime do art. 33, LD e 3 anos e 6 meses de reclusão e 816 dias-multa para o crime do art. 35, LD, praticados por Tício. FIxo o regime inicial semiaberto para cada um dos delitos, haja vista a existência de circunstâncias favoráveis ao réu nas duas primeiras fases da dosimetria e em razão do quantum de pena fixado (art. 33, §2º, b, CP)

Nos termos do requerido pelo Ministério Público e em consonância com entendimento jurisprudencial, com fulcro no art. 69, CP, aplico o concurso material e somo as penas cominadas, de maneira que a pena definitiva de Caio fica no patamar de 23 anos, 9 meses e 18 dias de reclusão em regime inicial fechado, em razão do quantum de pena cominado e 2.375 dias-multa; e de Tício em 9 anos e 4 meses de reclusão em regime inicial fechado, em razão do quantum de pena cominado e 1.399 dias-multa.

Deixo de analisar a detração (art. 387, §2º, CPP), haja vista a ausência de elementos para tanto e tendo e vista se competência do Juízo da Execução Penal (art. 66, III, c, lei 7.210/84). Mantenho a prisão preventiva em razão do quantum de pena cominado, bem como em razão de não ter havido alteração das circunstâncias que justificasse a revisão da imposição de segregação cautelar com base no art. 312, CPP.

Incabível a substituição das penas privativas de liberdade por restritivas de direitos (art. 44, CP), tampouco cabe a suspensão da pena (art. 77, CP), em razão do quantum de pena cominada.

Diante do exposto, afastadas as preliminares, julgo procedente a pretensão punitva estatal para condenar CAIO à pena de 23 anos, 9 meses e 18 dias de reclusão em regime inicial fechado e 2.375 dias-multa em seu patamar mínimo, pela prática dos crimes descritos nos art. 33 e 35, LD c/c art. 40, VI, LD; e art. 16, parágrafo único, IV, lei 10.826/03; todos c/c art. 61, I, CP, em concurso material (art. 69, CP); e para condenar Tício à pena de 9 anos e 4 meses de reclusão em regime inicial fechado e 1.399 dias-multa, pela prática dos crimes descritos nos art. 33 e 35, LD c/c art. 40, VI, LD;  c/c art. 65, I e III, c, CP, em concurso material (art. 69, CP).

Não há que se falar em indenização ou comunicação à vítima (art.  201, §2º e art. 387, IV, ambos CPP), por se tratar de crimes vagos.

Sendo a moto e o dinheiro e demais bens apreendidos produtos de crime, não há que se falar em ressarcimento, mas sim, em perdimento do bem em favor do fundo mencionado no art. 69, §9º, LD. Destrua-se a amostra reservada para contraprova (art. 72, LD).

Condeno os réus ao pagamento das custas, na proporção de 50% para cada um, nos termos do art. 804, CPP.

Comunique-se o Insituto de Identificação Criminal (INI); comunique-se o Tribunal Regional Eleitoral (TRE), nos termos do art. 15, III, CF; e expeça-se guia de recolhimento provisória. Proceda-se com relação à multa nos termos do art. 50, CP.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

 

Local, data

Juiz de direito substituto.

 

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