Um médico ingressou na Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 1980 como professor, pelo regime celetista, posteriormente convertido em cargo público pelo Regime Jurídico Único dos Servidores da União, aposentando-se em 2005 pelo regime próprio federal. Ao mesmo tempo, laborou em consultório médico, efetuando as contribuições previdenciárias como contribuinte autônomo, e, completados o período e a carência necessários, requereu sua aposentação pelo Regime Geral de Previdência Social. A Autarquia Previdenciária indeferiu a pretensão sob argumento de que o tempo como contribuinte individual (1980 a 1990) já foi utilizado na concessão da primeira aposentadoria, pelo regime próprio, uma vez que é vedada a contagem do tempo do serviço público com o de atividade privada, quando concomitantes.
A partir do caso descrito, analise e fundamente:
a) Está correto o indeferimento, feito pelo INSS, do benefício de aposentadoria como médico pelo Regime Geral da Previdência Social?
b) É possível a cumulação das duas referidas aposentadorias, com aproveitamento de tempo de contribuição como médico contribuinte autônomo concomitante com período laborado como professor em Universidade Federal, mas com vínculo originário celetista?
c) Discorra sobre os institutos envolvidos na solução do caso em tela, apontando a legislação incidente e os fundamentos pertinentes.
Respondendo aos questionamentos do enunciado, verifica-se que está Incorreto o indeferimento por parte do INSS do benefício de aposentadoria como médico pelo Regime Geral de Previdência Social – RGPS.
É possível, nesse caso excepcional, a cumulação em virtude da convolação do emprego em cargo público, o que resultou na transposição do período de contribuição como celetista ao RPPS.
A contagem recíproca é instituto que consiste na possibilidade de aproveitamento do tempo de contribuição na atividade perante o Regime Próprio- RPPS bem assim do tempo de contribuição na administração pública perante o RGPS, conforme preceito constitucional (parágrafo 9º, art. 201).
É a possibilidade de transposição do tempo de contribuição de um regime de previdência para outro, diverso com uma compensação financeira entre os regimes.
Os dispositivos legais correlatos são: arts. 94 a 99 da Lei 8.213/91, arts. 125 a 135 do Dec. Nº 3.48/99 e ainda o artigo 247 da Lei nº8.112/90. Há vedações como aproveitamento de períodos concomitantes de regimes diversos, a utilização num regime de tempo já utilizado para a concessão de aposentadoria em outro.
O médico da UFRGS possuía dos vínculos previdenciários diversos, um de professor no qual ingressou como celetista (RGPS) e sendo depois convertido a regime estatutário após A LEI 8.112/90; e o outro como contribuinte individual, como médico na iniciativa privada.
O INSS alega que quando da transposição do período como celetista para o RPPS também teria sido transferido o período como contribuinte individual e igualmente considerado para sua aposentadoria no regime próprio.
Há, no caso, uma excepcional situação que foi a convolação do emprego público em cargo público, ocasião na qual houve transferência do tempo de contribuição para o Regime Próprio. Porém, os recolhimentos como contribuinte individual continuaram a ser vertidos ao RGPS. Dessa forma, o que se verificou foi o desempenho de atividades diversas com recolhimentos a regimes diversos. A transformação de emprego em cargo público é precedida de compensação financeira entre os sistemas, apesar da modificação da natureza jurídica do vínculo.
É importante observar que no caso a acumulação, também é permitida pela regra do artigo 37, XVI, c , da CF, (dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde).
Desse modo, entre os anos de 1980 a 1990 é possível desdobrar as contribuições que eram vertidas ao RGPS, relativas a dois vínculos diferentes ( empregado público celetista e, outro na iniciativa privada) em dois tempos de contribuição distintos e concomitantes, inclusive porque ao ingressar no regime próprio passou a contar o tempo desde o ingresso como celetista, e ao mesmo tempo seu vínculo como autônomo também se conta da mesma data de ingresso, no ano de 1980.
Romildson... questão difícil hein?! Vc se saiu muito bem, principalmente quando fez a conclusão no último parágrafo. Achei apenas que o desenvolvimento da resposta esta um pouco confuso, tem muito conteúdo, tem muita informação, mas os parágrafos não estão totalmente ligados um com o outro (ex: vc falou da contagem recíproca, mas não apontou exatamente o caso concreto com ela). Acho interessante vc dar uma lida no julgado do STJ. Segue algumas considerações sobre a questão.
O caso trata de DUAS aposentadorias, uma pelo RGPS e outra pelo RPPS. Sendo plenamente possível, já que cumpriu os requisitos para aposentadoria em cada um desses vínculos isoladamente, razão pela qual poderia se aposentar por cada um deles, já que são cargos cumuláveis (art.37,XVI,CF), não precisaria utilizar da contagem recíproca (levando o tempo de um regime para o outro – art.201, §9, CF).
A dificuldade da questão está no período de 1980 a 1990, pois refere ao período anterior a conversão em cargo público, razão pela qual havia contribuição ao RGPS para as duas profissões (professor e médico). Não havendo contagem de tempo distinta (isolada), deveria somar o tempo de contribuição (art.32 da lei 8213/91).
Ocorre que quando o emprego público (cargo de professor) foi convolado em cargo público, houve a transferência do seu tempo de contribuição para o RPPS quando dessa conversão e os recolhimentos como contribuinte individual (médico) continuaram vinculados ao RGPS. Portanto, há o desempenho de atividades diversas (professor e médico) com recolhimentos destinados a regimes distintos (RPPS e RGPS), permitindo-se o desmembramento dos vínculos para utilização em regimes diversos. Embora modificada a natureza do vínculo (empregado público para servidor público) o exercício do cargo se manteve intacto e foi procedida a devida compensação financeira entre os dois regimes.
Segundo o STJ “Não há óbice para utilizar o tempo prestado ao estado no regime celetista para fins de aposentadoria estatutária e as contribuições como contribuinte individual na concessão da aposentadoria previdenciária por tempo de contribuição, não havendo falar em violação ao princípio da unicidade de filiação.” E continua “Na verdade, o art. 96 da Lei 8.213/91 veda apenas que o mesmo lapso temporal, durante o qual o segurado exerceu simultaneamente uma atividade privada e outra sujeita a regime próprio de previdência, seja computado em duplicidade, o que não é o caso dos autos. Não há contagem em duplicidade, uma é decorrente da contratação celetista, e outra da condição de contribuinte individual.” (AgRg no REsp 1444003/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/05/2014, DJe 15/05/2014) (...)
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
9 de Agosto de 2018 às 10:51 MARIANA JUSTEN disse: 0
(...)Acrescento ainda que o STJ manteve o acórdão do TRF4 que assim dispunha que é “Possível o cômputo, para a obtenção de aposentadoria junto ao RGPS, do tempo de serviço em que, de forma concomitante, o segurado verteu contribuições para o Regime Geral na condição de empregado público, tendo em vista a transformação do emprego público em cargo público, em que passou a ter regime próprio de previdência.” A fundamentação está no fato de que a “Hipótese dos servidores públicos federais, em relação aos quais houve submissão, por força do art. 243 da Lei n. 8.112/90, ao novo regime instituído, com a previsão expressa, no art. 247 da mencionada norma, de compensação financeira entre os sistemas, de modo que, se os empregos públicos foram transformados em cargos públicos, o tempo celetista anterior foi incorporado, de forma automática, ao vínculo estatutário, com a compensação financeira entre os sistemas (...)”
Em síntese: o período de 1980 a 1990 o tempo de serviço e as contribuições recolhidas na condição de contribuinte individual (médico) não se confundem com o vínculo empregatício mantido como servidor público estadual (professor), podendo usar o tempo prestado no regime celetista para fins de aposentadoria estatutária e as contribuições como contribuinte individual na concessão da aposentadoria previdenciária por tempo de contribuição. Não há contagem em duplicidade, uma é decorrente da contratação celetista e outra da condição de contribuinte individual.
Conclui-se que: exercício simultâneo de atividades vinculadas a regime próprio e ao regime geral, havendo a respectiva contribuição, não impede o direito ao recebimento simultâneo de aposentadorias em ambos os regimes.
Na alternativa “a” a resposta é que está incorreto o indeferimento por parte do INSS. Conforme você indicou no primeiro parágrafo.
Na alternativa “b” a resposta é que é possível a cumulação das duas aposentadorias RGPS (médico) e RPPS (professor), em virtude da convolação do emprego em cargo público na profissão de professor, o que resultou na transposição do período de celetista (RGPS) ao RPPS, já que houve a respectiva contribuição. Conforme você indicou no segundo parágrafo.