João era casado com Maria, mas dela se separou apenas de fato, continuando a ser o responsável pela sua subsistência. João então faleceu e o INSS deferiu, administrativamente, a pensão decorrente da sua morte da seguinte forma: 50% para Maria, por ter ficado comprovado que ela era economicamente dependente dele; 50% para Francisca, por ter entendido o INSS que havia união estável entre João e Francisca.
Francisca ajuizou então ação na Justiça Estadual para o reconhecimento judicial de sua união estável com João, tendo no polo passivo Maria, com o objetivo de, a partir da declaração judicial de sua relação com João, abrir caminho para futura discussão sucessória em relação aos bens deixados pelo "de cujus".
Devidamente instruído o feito, foi prolatada pelo Juiz de Direito a sentença de improcedência, com confirmação posterior pelo Tribunal de Justiça, na qual ficou expressamente consignado que não houve união estável entre João e Francisca.
Com base nesse documento, Maria pediu então ao INSS, que não fizera parte da ação judicial, a reversão da cota-parte de Francisca em seu favor. O INSS, após o devido procedimento administrativo, com respeito ao contraditório e à ampla defesa em relação a Francisca, cancelou o benefício desta e passou a pagar a pensão no montante integral para Maria.
Diante dessa situação, Francisca ajuizou ação contra Maria e o INSS, agora na Justiça Federal, requerendo o deferimento da pensão em seu favor, se não no montante integral, ao menos na metade, alegando, para tanto, que vivera em união estável com João por mais de cinco anos. Maria contestou, alegando coisa julgada. O INSS contestou apenas para alegar que a autora não tinha interesse de agir, vez que não podia mais provar a união estável, pressuposto para a concessão do benefício previdenciário. Francisca, em réplica, alegou que não há coisa julgada, visto que o pedido na nova ação é de concessão de benefício previdenciário, sendo o pedido naquele outro processo o de declaração judicial da união estável. Além disso, argumenta Francisca, as partes não são exatamente iguais, já que o INSS não participou daquele feito. Logo, não estariam preenchidos os requisitos do art. 337, § 2º, do CPC, quanto à identidade de ações.
O processo veio concluso para o magistrado.
Diante da situação hipotética acima narrada, discorra sobre o instituto da coisa julgada e se posicione, de forma fundamentada, a respeito de uma das três possibilidades seguintes: a) extinção do feito com fundamento na coisa julgada; b) extinção do feito com fundamento na falta de interesse de agir; c) prosseguimento do feito, para instrução, com rejeição fundamentada das duas hipóteses anteriores. Não é necessário redigir a resposta em formato de peça processual.
Tradicionalmente, há coisa julgada quando se repete ação que já foi decida por trânsito em julgado, em que há identidade de partes, pedidos e causa de pedir (art. 337, §1 e §4, CPC). Essa é a chamada teoria da tríplice identidade.
Contudo, essa teoria não resolve todas as questões relacionadas à coisa julgada, pois, muitas vezes, um processo pode afrontar a coisa julgada decidida em processo anterior, embora não haja essa tríplice identidade.
Diante disso, surgiu a teoria da identidade da relação juridica. De acordo com essa teoria, há desrespeito à coisa julgada, quando num outro processo decide-se uma relação jurídica de forma contrária a que já foi decidida, com trânsito em julgado, em processo anterior, embora não haja a identidade, concomitante, de partes, pedido e causa de pedir.
No caso em questão, ficou decidido, com trânsito em julgado, no processo que tramitou na Justiça Estadual, que Francisca não vivia em união estável com João. Essa questão da inexistência da uniao estável é a relação juridica que não pode mais ser decidida contrariamente em outro processo, sem que haja ofensa à coisa julgada.
Feitas tais considerações, passa-se a analisar os itens propostos:
a) no processo que Francisca ajuizou contra Maria e o INSS, realmente, não foi repetida a mesma ação que Francisca ajuzou na Justiça Estadual, pois se tratam de partes (Maria e INSS x Maria) e pedidos (benefício previdenciário de pensão por morte x reconhecimento da uniao estável) e causa de pedir distintas. Sendo assim, não há que se falar em coisa julgada à luz da teoria da tríplica identidade. Assim, não cabe a extinção do processo sem resolução do mérito, devendo ser afastada a preliminar de coisa julgada suscitada por Maria,
b)Também não há que se falar em falta de interesse de agir por impossibilidade de provar a união estável, preliminar suscitada pelo INSS. Com efeito, a questão acerca da possibilidade de se provar ou não à uniao estável é mérito, e não preliminar. O interesse de agir de Francisca persiste, o qual se traduz no trinômio da necessidade/utilidade/adequação. Tendo em vista que a cota do benefício da autora foi cessado administrativamente, a via processual utilizada por Francisca é últil, necessária e adequada para a companheira obter o bem da vida buscado (restabelecimento do benefício cessado administrativamente). Desse modo, patente o interesse de agir.
Desse modo, superadas tais preliminares, o processo dever ser encaminhado para análise do mérito.
c) No mérito, o pedido deve ser julgado improcedente, pois não há o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte à companheira, pois inexistente a uniao estável. É que com base na teoria da identidade da relação jurídica, o juiz federal, à vista da decisão da justiça estadual transitada em julgado, nao pode decidir contrariamente àquela decisao estadual, sem que haja afronta à coisa julgada definitivamente decidida naquele processo.
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
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