A Lei n.º 9.613/98, de 3 de março de 1998, conhecida como Lei da Lavagem de Dinheiro, resulta de compromisso assumido pelo Brasil com a comunidade internacional ao firmar a Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de substâncias Psicotrópicas, nomeada como Convenção de Viena, de 20 de dezembro de 1988, referendada pelo Brasil em 1991 e aprovada pelo DL nº. 162/91. Considerando o contido no texto precedente e a relevância da citada Lei para atacar a criminalidade organizada no aspecto financeiro, responda fundamentadamente às indagações seguintes: a) Elenque e conceitue as três fases para a configuração dos delitos previstos na referida Lei, segundo as definições do GAFI (Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo), sustentando ao final acerca da necessidade da ocorrência das três fases para a consumação do ilícito; b) Determine, segundo as três principais correntes doutrinárias, o bem jurídico tutelado pela Lei; c) Dentro do âmbito de aplicação da presente Lei, defina crime parasitário e responda se o crime de sonegação fiscal pode ser crime antecedente em relação ao de lavagem de dinheiro e d) Existe a possibilidade de ocorrência de concurso material entre o crime antecedente e o de lavagem de dinheiro, ou esta hipótese se constitui em verdadeira progressão criminosa?
a) Segundo as definições do GAFI, a lavagem de capitais possui três fases: colocação, dissimulação e integração. A colocação é a introdução do dinheiro ilícito no sistema financeiro, tornando difícil a identificação da origem destes, com a finalidade de não demonstrar a ligação entre o sujeito ativo e o resultado obtido com a infração penal antecedente. Pela dissimulação, são realizados diversos negócios com a finalidade de impedir o rastreamento e encobrir a origem ilícita dos valores. Por sua vez, a integração consiste na incorporação ao sistema econômico dos bens com a aparência lícita, com a compra de bens móveis ou imóveis, por exemplo.
Por fim, destaca-se que não é necessária a ocorrência destas três fases para que se considere ocorrida a infração penal. De fato, exemplificativamente, nenhum dos tipos penais exige que o dinheiro venha a ser integrado com aparência lícita ao sistema econômico.
b) Quanto ao bem jurídico tutelado, quatro correntes se digladiam. A primeira entende que a lavagem de capitais tutela o mesmo bem jurídico da infração penal antecedente, caracterizando uma superproteção deste. Segunda corrente defende que tutela a administração da justiça. Por sua vez, terceira corrente (majoritária) defende que o bem jurídico tutelado é a ordem econômico-financeira, enquanto a quarta corrente sustenta a pluriofensividade do delito (há quem entenda que ele tutela: ordem econômico-financeira e a administração da justiça; administração da justiça e o bem tutelado pela infração antecedente).
c) Crime parasitário/acessório é aquele cuja prática está vinculada ao cometimento de infração penal antecedente (no caso da lavagem de capitais, infração que produza dinheiro, bem ou valor que será objeto da ocultação). Entretanto, conforme artigo 2º, II da Lei 9613/98, eventual condenação pelo antecedente não é requisito para a lavagem de capitais. Conforme aponta a doutrina, para a tipificação do delito de lavagem de capitais, o fato antecedente deve ser típico e ilícito, não sendo necessário comprovar autoria, culpabilidade ou punibilidade deste.
Por fim, o crime de sonegação fiscal pode ser antecedente em relação ao de lavagem de capitais, uma vez que o caput do artigo 1º da Lei 9613/98 (alterado pela Lei 12683/12) exige que bens, direitos ou valores provenientes de qualquer infração penal.
d) Trata-se da chamada autolavagem, sendo que em alguns países aquele que é o autor da infração antecedente não responde pelo crime de lavagem. Na Lei 9613/98 não existe proibição, razão pela qual doutrina majoritária defende a possibilidade da responsabilização criminal do autor da infração penal anterior. Isto porque, conforme a maioria, trata-se da tutela de bens jurídicos diferentes, sendo que a ocultação gera lesão autônoma. No entanto, alerta-se que, quanto as modalidades “adquirir, receber e receber em garantia” (artigo 1º, §1º, II) o sujeito ativo será necessariamente outra pessoa, por questão lógica.
QUESTÃO
PEÇA
SENTENÇA
22 de Março de 2018 às 21:13 Bruno Ville disse: 0
Excelente resposta. Falou mencionar que quanto à sonegação fiscal deve ser observada a SV 24, de modo que nem a infração antecedente e nem a lavagem podem ocorrer antes do lançamento definitivo do tributo nos incisos I a IV do art. 1° da respectiva lei.